Redimir os nossos pecados é um conceito que entrou a custo na minha mente com 13 ou 14 anos nas longas conversas da catequese, na Igreja de S. Pedro em Ponta Delgada.
Redimir é reparar, salvar, resgatar, corrigir. Mas redimir tem um sentido muito próprio que só a palavra redimir consegue alcançar. Caso contrário a palavras não existia.
The counter cards (O jogador) de Paul Schrader é um filme sobre remissão.
Taxi Driver, a Obsessão, A Última Tentação de Cristo são filmes que tiveram a sua assinatura na escrita do argumento. Mas a sua marca está presente desde 1978 e em mais de 20 filmes.
É o cineasta da contensão. Sente que é alguém que gosta de escrever e escreve o que filma. Há, portanto, a complexidade das palavras e a intimidade das emoções mais profundas que uma escrita minuciosa permite. E, no entanto, é um filme de silêncios que falam por si.
Logo no início do filme sente o peso do passado. O filme tem um genérico inicial, coisa que praticamente desapareceu no cinema do séc. XXI. Foi filmado em digital, mas a proporção da imagem é 1,66 : 1, o formado da imagem europeu dos anos 60. A imagem é quase quadrada, íntima.
As primeiras cenas remetem-nos para um certo imaginário do cinema americano: prisões=crime=violência=guerra=jogo logo pulsões básicas do ser humano.
O personagem é alguém que, descobriu a mecânica interna dos jogos de baralho, aprendendo a contar as cartas e conseguindo antecipar jogadas. Joga com contenção, sem excessos. “Se ganhas, sais. Se perdes, sais também”. É aqui que começa a remissão do passado. Um passado de excessos?
O desejo que move o personagem central é o desejo de remissão. O que nos prende ao ecrã é saber se esta remissão é possível ou não.
Como não americano e europeu, pergunto-me se é possível aos EUA redimirem-se dos que foram os seus pecados. E são os próprios americanos que acham que houve pecados, mesmo cometidos em nome da liberdade ou da democracia.
Mas não foram só os americanos que cometerem erros. Os europeus são também pecadores de crimes terríveis. De certa forma, continuamos a cometê-los.
E há remissão para estes pecados?
A última imagem do filme dá uma pista. É uma proposta de um cineasta, nascido em 1946. Pertence a uma geração que atravessou a 2ª metade do séc. XX e assistiu a muita coisa.
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