Primeiras memórias

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Cine S. Pedro, Calheta, Ponta Delgada.

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A Calheta era um pequeno porto de pesca no lado oriental da cidade de Ponta Delgada. Portanto, era zona de gente pobre. Mais ao lado, o Hotel da Boa Nova, nome irónico que chamávamos ao Estabelecimento Prisional da cidade, um edifício de 3 pisos, de finais do século XIX.

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Mesmo em frente à Prisão, ficava o Cine S. Pedro, cinema que passava sempre dois filmes, depois de estes estrearem no Cine Vitória, cinema do outro lado da cidade, num um bairro de gente rica, com ruas bordejadas de boas moradias.

Foi aí que uma criança de 6 anos, em 1966 foi ao cinema pela primeira vez.

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Em casa não havia televisão, pois esta ainda não existia nos Açores nos anos 60. Logo o cinema era um grande mistério.

 

E aí começou um grande equívoco.

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O filme contava uma história passada uma companhia de teatro de marionetas. Havia um drama terrível, uma ameaça cujos contornos não me lembro. Eram marionetas acionadas com inúmeros fios verticais.

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No intervalo, meu pai levou-me pela mão até à cabine de projeção.

 

Vi os enormes projetores e as gigantescas bobines de película. O projecionista mostrou-me as tiras de filme perfurado e chegou a oferecer-me um pedaço com dois ou três fotogramas.

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Logo aí o primeiro mistério: como é que aquelas máquinas que estavam atrás de nós, na sala recheada de cadeiras, faziam surgir imagens animadas do outro lado da sala, numa parede branca que estava à nossa frente, quando nos sentávamos?

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No final do filme, ainda me lembro de perguntar ao meu pai: "Como é que aquilo mexia?"

 

Referia-me obviamente às imagens que surgiam no ecrã.

 

Ao que meu pai respondeu que eram uns fios pendurados.

Claro que meu pai se referia à marionetas do filme, mas a minha pergunta referia-se às imagens no ecrã.

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Enfim, fui fascinado para casa, mas completamente baralhado.